Freqüentemente as pessoas insistem para que nos posicionemos sobre o fato de nos consideramos ou não como os porta-vozes do movimento francófono de libertação animal, e se, por causa disso, aceitamos todos os textos que recebermos. Como há pouco tempo tal questão manifestou-se mais uma vez, eis uma oportunidade para esclarecermos o assunto.
Anteriormente, os Cahiers antispécistes se denominavam Cahiers Antispécistes de Lyon, pois pensávamos que revistas similares apareceriam em outras cidades. Tal denominação foi suprimida, não pelo fato de que nos transformaríamos no órgão nacional do movimento de libertação animal, mas para suprimirmos a impressão que poderíamos ser chauvinistas, regionalistas, centrados em Lyon, ou apenas em nós mesmos... Os Cahiers são essencialmente a obra de indivíduos que asseguram a função do comitê de redação, que procuram toda contribuição e todo tipo de associação que lhes convenha, ou, que lhes pareça estar de acordo com a idéia que tenham sobre a libertação animal: em uma base que seja política mas que também possua afinidades. Propuseram-nos criar um fórum de discussões aberto aos militantes para expressar todo tipo de idéias e não apenas as nossas, e cujos critérios de aceitação ou recusa dos textos seriam explícitos. Tentar propor critérios explícitos, objetivos ou suficientemente precisos para permitir julgar-se o caráter arbitrário ou legítimo da recusa de publicação de um texto não nos parece de forma alguma possível, pois muitos parâmetros podem ser levados em consideração em uma apreciação e não se conjugarem uns com os outros para que possamos, logo de início, fazermos um inventário. Preferimos discutir sobre cada texto que apareça, cada caso sendo um caso (as decisões são tomadas após uma discussão entre três pessoas que atualmente asseguram o comitê de redação); isso resulta de uma escolha que nós fizemos, mas também por causa da dificuldade que sentimos que teríamos em deixar bem claro critérios rígidos e também pela dificuldade que teríamos ao sermos obrigados a respeitá-los (por exemplo: como poderíamos explicar, formular, de modo geral, o que nos faria decidir se um artigo é interessante ou não?). Sempre ficou claro para nós que não vamos publicar tudo o que recebemos, independentemente do que nós pensamos sobre o material recebido (artigos perigosos ou sem conteúdo, ou fora do tema...).
Nós somos adeptos de rubricas de discussão nos CA, e de recebermos textos para publicarmos, mas nos sentiríamos desonestos se garantíssemos a publicação de todo texto recebido, ou nos sentiríamos às vezes obrigados a publicar – e não desejamos isso. Nós podemos, é lógico, às vezes, publicar artigos com os quais não estamos de forma alguma de acordo, mas para isso é necessário que tenhamos tempo, energia e disponibilidade de espírito para podermos escrever uma resposta ou observações críticas: e nem sempre temos essas possibilidades... Ninguém deve esquecer que somos apenas três pessoas a cuidar da revista, e que temos também outras atividades que às quais igualmente nos dedicamos com afinco.
No último número recusamos, pela primeira vez, publicar um texto (que apareceu no jornal Sablero; cf. página 33 do atual numero dos CA) que estava ligado diretamente à libertação animal pois criticava um outro texto importante que foi publicado em nossas colunas, «Que tous les animaux soient égaux», redigido por David Olivier (nos CA n.10); este artigo do David já tinha provocado uma crise no seio dos CA, assim como debates animados e a decisão de não mais publicarmos o texto que o criticava também levou tempo para ser tomada, e o foi, após cerca de um mês de discussões contínuas, também pelo fato de nos encontrarmos em uma posição difícil, na qual éramos juízes e parte interessada. Tendo esclarecido isso, acrescento que já tivemos a oportunidade de dizer a frugívoros que queriam escrever um artigo sobre a sensibilidade das plantas que não poderíamos lhes dar a certeza que publicaríamos o artigo pois a publicação dependeria do conteúdo: e, na verdade, nunca nem recebemos o texto. Por outro lado, já recusamos inserir anúncios classificados que julgamos não terem nenhuma relação direta com a libertação animal, e publicar endereços de associações que acreditamos não terem nada a ver com uma política de libertação animal, etc.
E, quando aceitamos textos, pedimos, às vezes, que estes sejam revisados, corrigidos ou mesmo resumidos para serem publicados nos CA: é o caso do artigo de Yves Bonnardel contra a LFDA, de um outro de David Olivier, respondendo à AIDA e um pouco também aquele que critica a política de Singer (nos CA n.10), como é o caso ainda dos artigos escritos por P. Moulhérac, E. Salabert, E. Réus ou Y. Bonnardel no presente número. Todas as vezes, as correções acontecem para condensar o texto, reduzir seu caráter polêmico a favor de uma argumentação mais segura ou para eliminar as passagem julgadas muito difíceis, ou pouco expressivas com relação ao espaço que tomam na revista... Sempre que mudanças foram realizadas, o autor estava de acordo ou ele mesmo as realizou.
Enfim, uma das conseqüências a posterior da publicação do famoso artigo de David Olivier nos CA n.10 foi a decisão de não mais transmitirmos artigos polêmicos e/ou muito pessoais nos Cahiers: por causa do entrelaçamento de rancores pessoais e de divergências políticas que tais publicações possam porventura ocasionar e, enfim, por questões de «visual»: não queremos que os CA se tornem uma arena de disputas, fato que poderia desencorajar as pessoas, inclusive aquelas que nós tentamos sensibilizar e que ainda não conhecem a libertação animal.
Resumindo: sim à crítica das idéias, não à crítica pessoal.
Resumindo ainda mais: os CA não desejam representar o movimento em sua totalidade, até pelo fato deste movimento não possuir atualmente algum contorno preciso. Por outro lado, a existência de outras revistas é sempre desejável. Ficamos satisfeitos com o nascimento recente de dois jornais que tratam inteira ou parcialmente a questão da libertação animal (ver páginas 10 e 33 deste número), e é também por isso, entre outros motivos, que encorajamos o projeto de vários militantes de criarem um jornal que seria um órgão de expressão, de discussão e de união do movimento (conferir o balanço da reivindicação páginas 11 a 14 deste número); esse tipo de jornal poderia ter especialmente diversas funções que os Cahiers Antispécistes não têm.